terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Camisa de Vênus - Simca Chambord



Uma música pra lembrar o passado.
Com sutileza somos lembrados das transformações que vivemos, de perdas e ganhos, de sonhos e inocências...
É interessante observar como nem tudo é óbvio, como em um rock dançante pode ser esconder um retrato de um país.

Vitórias Ilusórias.

Muitas vezes somos tomados por uma sensação de satisfação com nossos feitos, conquistamos ou superamos algo e temos aquela sensação de realização.
Assim como esta sensação, temos a sensação de fracasso, de incapacidade e tantas outras.
Quando fazemos a leitura errada, podemos ter um diagnóstico errado sobre nossas vidas.
Se carregarmos na tinta aqui e ali, teremos a falsa noção do que somos, do que fazemos e de nossa capacidade.
É coisa de governante: “Nunca antes na história...”.
Afinal, somos bem sucedidos ou fracassados?
Difícil afirmar, na realidade acho uma discussão inútil, afinal podemos ser extremamente bem sucedidos num aspecto da vida e totalmente fracassado em outro.
Podemos ser ótimos pais e péssimos profissionais.
Claro que ninguém é tão extremo assim, quem tem competência para ser ótimo pai não é tão incompetente a ponto de ser péssimo profissional.
É neste ponto que quero chegar: o equilíbrio.
É em pegar emprestados talentos de outras áreas que construímos nosso equilíbrio, é analisando nossa capacidade de equilibrar capacidades que podemos enxergar nossos sucesso ou fracasso.
Muitas vezes estouramos champanhe por uma vitória profissional e logo depois voltamos para nossos lares desestruturados, comemoramos o sucesso da equipe e voltamos para nossa casa vazia.
Muitas vezes ficamos presos a pequenas vitórias e achamos que o somatório delas no decorrer do tempo transformará nossas vidas.
Focados demais no presente, esquecemos de olhar que o tempo vai passando, enquanto comemoramos as pequenas e ilusórias vitórias, vamos deixando de fazer as transformações maiores.
Uma casa bem construída tem base forte, parede com tijolos bem encaixados, passagens bem definidas e cobertura intransponível.
Não se improvisa, de que adianta base forte sem telhado? De que adianta paredes sem passagens bem definidas?
Vamos ficar comemorando pequenos feitos enquanto a grande obra vai sendo adiada.
Vamos colecionando medalhas quando é desnecessária premiação por transformações efetivas.
Equilíbrio. Talvez você não ganhe a medalha de ouro por ser bom em uma prova, mas ganhará felicidade, satisfação e paz se conseguir equilibrar seus feitos.
Evidentemente não estou pregando uma vida meio termo, até porque uma vida equilibrada eleva sua base para um patamar tão alto que você pode alçar vôos maiores.
Será um ótimo pai, um chefe competente, um esposo muito amado, um amigo sempre presente, um filho adorável...
Ninguém está livre das armadilhas da vida, ela sempre irá pregar peças, oferecer recompensas que nos desviem das transformações fundamentais, mas me questiono se vale a pena sacrificar toda uma vida, todos os aspectos dela para viver uma felicidade por vezes egoísta, que só serve pra nós mesmos.
Não estou mandando recados, sou reflexivo até de minha própria existência, olhar para os outros me faz olhar pra mim mesmo, muito do que eu digo aqui me serve, é um lembrete pessoal, que bom que sirva também para mais pessoas, mas quero que saibam que só tem graça observar se isto também puder me acrescentar algo, me ensinar, me lembrar, me alertar, me tirar da comodidade de achar que está tudo sob controle.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Limites.

Existe uma noção sempre muito pessoal sobre esforço, acreditamos que estamos dando o máximo de nós e não percebemos os limites que nós mesmos nos impomos ou determinamos.
Travas e limites que determinam o alcance de nossas ações.
Medo, constrangimento, insegurança, teatralidade, conveniência e tantas possíveis explicações justificam nosso mergulho superficial.
O mais interessante é que esta é uma visão muito particular, normalmente quem vê de fora percebe logo, óbvio, desde que haja o mínimo de atenção na observação.
Muitos perdem os empregos, namorados, amigos, oportunidades porque sua entrega está aquém do que supõe.
Esta leitura errada tira de nós justamente aquilo que queríamos conquistar.
Por vezes nos surpreendemos com as pessoas descrevendo seus mergulhos profundos em projetos, relatando dificuldades e dores que não conseguimos imaginar simplesmente porque não é assim que enxergamos.
Nos perguntamos como pode se tudo parece tão dentro da normalidade? Como pode se muitas vezes até achamos o oposto, ou seja, que a pessoa tem sido leniente com um objetivo?
Na realidade, a pessoa tem convicção de que faz a coisa certa, se emprega ao máximo atrás de seus objetivos, e isto de fato corresponde à verdade.
Afinal, o limite de cada um é difícil de mensurar, é uma linha invisível mas extremamente resistente, é uma linha que contém, limita nossos esforços.
Não nos preparamos pra enfrentar este limite, até por que na maioria das vezes nem o reconhecemos.
Vitorioso é aquele que não só reconhece, mas que enfrenta seus limites.
Ao traçar metas, objetivos, é bom termos em mente que entre nós e nossos objetivos pode existir uma linha limitadora, e colocarmos na bagagem equipamentos pra vencê-la.
Parece tarefa fácil, mas quando perdemos é que nos damos conta do tamanho do problema.
Isto, óbvio, se não resolvermos culpar os outros ou fatores externos, evidente que eles existem e são capazes de nos derrotar, mas que se faça boa leitura antes de se cometer tal injustiça, porque muitos de nossos fracassos devem ser depositados somente em nossas contas pessoais.
É impressionante a quantidade de ações fantasiosas que fazem parte de nossas histórias, é assustador como perdemos anos saudáveis de nossas vidas em projetos mal dimensionados ou mesmo mascarados.
Vestimos roupas de palhaços e desfilamos orgulhosos sem nos darmos conta do ridículo ou da perda de tempo, porque ao investirmos da maneira errada, estamos jogando tudo fora.
Quem dera sempre tivéssemos sabedoria pra investir a energia certa, no tamanho certo em busca daquilo que existe de mais valioso pra nós, sem nos desviarmos por tentações banais ou iscas do destino.
Quem dera nossos esforços sempre fossem sinceros e verdadeiros, jamais passando pelo folclore de tantas empreitadas infelizes e desmedidas.
Quem dera não perdêssemos aquilo que tanto desejamos por limites que nos interpomos, ou simplesmente deixamos lá por preferirmos ignorá-los.
Viver é sempre um desafio, não existe caminho fácil, mas é sempre tão bom ter uma vitória verdadeira...

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Zé Ramalho - Chão de Giz.



Boa música, letra cheia de entrelinhas e um dos melhores intérpretes da MPB.
Proporcionar bons momentos a quem nos visita é sempre bom.

:-)

Muletas


Projeto 5
Upload feito originalmente por Guilherme Gomes.


Existem pessoas que não vivem a não ser em função das outras.
Desenvolvem várias personalidades para serem aceitas em vários grupos sociais, se apoiando nos diversos membros destes grupos.
Carentes, precisam de aprovação, de serem queridas, não se importam com o respeito, se importam com a aprovação.
Usam de várias estratégias, como camaleões, se inserem nos grupos, permanecem camuflados mesmo sem compartilhar das idéias e ideais dos seus membros.
É comum que tais pessoas participem de vários grupos ao mesmo tempo, grupos muitas vezes díspares, opostos.
São capazes de ações que quando confrontadas, não apresentam menor sentido, por exemplo, podem ouvir funk ou bossa nova, podem ter atividades físicas intensas ou levar uma vida indolente.
A lógica de tudo reside no conceito de muleta, a pessoa deixa de ter vida própria pra se apoiar nos outros, sem atitude, sem convicções, sem vontade própria a pessoa se apega aos outros, a aceitação dos outros.
Mas um dia as portas começam a fechar, as muletas começam a escassear, e elas se dão conta de que estão num caminho sem saída.
Algumas vezes surge uma muleta definitiva, que irá amparar pelo resto dos dias, outras surge uma mão, que ensinará a caminhar sem muletas, mas algumas vezes só tem o abismo.
Uma coisa é certa, oferecer novas muletas não ajuda em nada, a não ser que você queira se beneficiar da dependência.
Dar a mão é uma grande responsabilidade, mas é uma responsabilidade que cabe a poucos, impossível dar as mãos se você não conseguirá sustentar por muito tempo, impossível dar as mãos se você não for o que a pessoa realmente precisa.
Boa vontade muitos tem, mas não basta.
As pessoas têm imensa dificuldade em tirar as muletas de quem gostam, é como tirar o andador da criança, como tirar as rodinhas da bicicleta, um dia você precisa fazê-lo.
Evidente que a pessoa vai cair e, eventualmente, se machucar, mas não são estas as regras do mundo?
Algum de nós consegue descrever um mundo real sem dor, sem quedas e tombos?
Existe uma linha de sabedoria difícil de alcançar, mas é nela que se encontra a atitude correta, seremos maiores sabendo o quanto podemos dar a alguém, sabendo o quanto podemos tirar de alguém.

Muletas Jamais!!!

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Se...

SE
(Ruyard Kipling)
Se consegues manter a calma quando à tua volta todos a perdem e te culpam por isso;
Se consegues ter confiança em ti quando todos duvidam de ti e aceitas as tuas dúvidas;
Se consegues esperar sem te cansares por esperar ou caluniado não responderes com calúnias ou odiado não dares espaço ao ódio sem porém te fazeres demasiado bom ou falares cheio de conhecimentos;
Se consegues sonhar sem fazeres dos sonhos teus mestres;
Se consegues pensar sem fazeres dos pensamentos teus objetivos;
Se consegues encontrar-te com o triunfo e a derrota e tratares esses dois impostores do mesmo modo;
Se consegues suportar a escuta das verdades que dizes distorcidas pelos que te querem ver cair em armadilhas ou encarar tudo aquilo pelo qual lutaste na vida ficar destruído e reconstruíres tudo de novo com instrumentos gastos pelo tempo;
Se consegues num único passo arriscar tudo o que conquistaste num lançamento de cara ou coroa, perderes e recomeçares de novo sem nunca suspirares palavras da tua perda;
Se consegues constringir o teu coração, nervos e força para te servirem na tua vez já depois de não existirem, e agüentares quando já nada tens em ti a não ser a vontade que te diz: "Agüenta-te!"
Se consegues falar para multidões e permaneceres com as tuas virtudes ou andares entre reis e pobres e agires naturalmente;
Se nem inimigos ou amigos queridos te conseguirem ofender;
Se todas as pessoas contam contigo mas nenhuma demasiado;
Se consegues preencher cada minuto dando valor a todos os segundos que passam;
Tua é a Terra e tudo o que nela existe e mais ainda,
tu serás um homem, meu filho!

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Diversão...

Vocês não sabem como é divertido o absoluto ceticismo.
Pode-se brincar com a hipocrisia alheia como quem brinca com a roleta russa com
a certeza de que a arma está descarregada.
Millôr Fernandes

Para refletir sobre a Mentira.

Fiquei magoado, não por me teres mentido, mas por não poder voltar a acreditar-te.
Friedrich Nietzsche

As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras.
Friedrich Nietzsche

É difícil perder-se. É tão difícl que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo.
Clarice Lispector

O amor pode morrer na verdade, a amizade na mentira.
Abel Bonnard

As pessoas que falam muito, mentem sempre, porque acabam esgotando seu estoque de verdades.
Millôr Fernandes

É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo.
Clarice Lispector

A mentira é muita vez tão involuntária como a respiração.
Machado de Assis

Meia verdade é sempre uma mentira inteira.
Provérbio Chinês

É difícil acreditar que um homem está a dizer a verdade quando você sabe que mentiria se estivesse no lugar dele.
Henry Mencken

Jamais diga uma mentira que não possa provar.
Millôr Fernandes

É verdade que se mente com a boca; mas a careta que se faz ao mesmo tempo diz, apesar de tudo, a verdade.
Friedrich Nietzsche

Nenhum mentiroso tem uma memória suficientemente boa para ser um mentiroso de êxito.
Abraham Lincoln

Uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir.
Winston Churchill

Assim como uma gota de veneno compromete um balde inteiro, também a mentira, por menor que seja, estraga toda a nossa vida.
Mahatma Gandhi

Quem disser que pode amar alguém durante a vida inteira é porque mente.
Florbela Espanca

O dom da fala foi concedido aos homens não para que eles enganassem uns aos outros, mas sim para que expressassem seus pensamentos uns aos outros.
Santo Agostinho

A origem da mentira está na imagem idealizada que temos de nós próprios e que desejamos impor aos outros.
Anais Nin

Engolimos de um sorvo a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga.
Denis Diderot

Não ser descoberto numa mentira é o mesmo que dizer a verdade.
Aristoteles Onassis

Quem planta a semente da mentira colhe a floresta da solidão...
Sm-Master

A mentira deriva, em geral, do medo injustificado.
Textos Judaicos

A verdade sem dúvidas é linda; assim como as mentiras.
Ralph Waldo Emerson

Não me importa a mentira, mas odeio a imprecisão.
Samuel Butler

Ninguém acredita em um mentiroso, mesmo quando ele diz a verdade.
Cícero

Em verdade, em verdade vos digo- mentir compensa
Rogério Viana

Soneto

Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono

Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo

Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar, com que navio
E me deixaste só, com que saída

Por que desceste ao meu porão sombrio
Com que direito me ensinaste a vida
Quando eu estava bem, morta de frio
Chico Buarque

Uma mentira vem logo no encalço de outra.
Terêncio

A mentira que beneficia vale mais do que a verdade que molesta.
Fênix Faustine

Timorato

Por trás de um caso,
Há mentiras a contar,
Que de tão covardes
Parecem verdades e
Deixaram-me com insônia.

Tuas expressões cansadas
Não enganam amadores
Porém os mestres se confundiram
Acreditando em poucas dores.

Os nós de teus projetos
Fizeram-se por se só
Não há um sequer
Que duvide de tua capacidade.
Em mentir, odiar,
Amar e afogar.
Não me tome mais.
Keidy Lee Jones




sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Crônicas de uma Época.


Aos nossos heróis e seu povo.
Qual será a verdade que se esconde na história contada e recontada?



Como Nossos Pais
(Belchior)

Não quero lhe falar meu grande amor das coisas que aprendi nos discos

Quero lhe contar como eu vivi e tudo que aconteceu comigo

Viver é melhor que sonhar, eu sei que o amor é uma coisa boa

Mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa

Por isso cuidado meu bem, há perigo na esquina

Eles venceram e o sinal está fechado prá nós que somos jovens

Para abraçar seu irmão e beijar sua menina na rua

É que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz

Você me pergunta pela minha paixão

Digo que estou encantada com uma nova invenção

Eu vou ficar nesta cidade, não vou voltar pro sertão

Pois vejo vir vindo no vento o cheiro da nova estação

Eu sei de tudo na ferida viva do meu coração

Já faz tempo eu vi você na rua, cabelo ao vento, gente jovem reunida

Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais

Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo que fizemos

Ainda somos os mesmos e vivemos...
Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais

Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não

Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém

Você pode até dizer que 'eu tô por fora, ou então que eu tô inventando'

Mas é você que ama o passado e que não vê

É você que ama o passado e que não vê

Que o novo sempre vem

Hoje eu sei que quem me deu a idéia de uma nova consciência e juventude

Tá em casa guardado por Deus contando vil metal

Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo, tudo que fizemos

Nós ainda somos os mesmos e vivemos...
Ainda somos os mesmos e vivemos...
Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais!


Ouro de Tolo
(Raul Seixas)

Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros por mês

Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso na vida como artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar um Corcel 73

Eu devia estar alegre e satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa

Ah! Eu devia estar sorrindo e orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa

Eu devia estar contente
Por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado

Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto: E daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes
Pra conquistar, e eu não posso ficar aí parado

Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família ao Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos

Ah! Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco praia, carro, jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco

É você olhar no espelho
Se sentir um grandessíssimo idiota
Saber que é humano, ridículo, limitado
Que só usa dez por cento de sua
Cabeça animal
E você ainda acredita que é um doutor, padre ou policial
Que está constribuindo com sua parte
Para nosso belo quadro social

Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarda cheia de dentes
Esperando a morte chegar

Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador

Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar

Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador


Geni e o Zepelim
(Chico Buarque)

De tudo que é nego torto
Do mangue e do cais do porto
Ela já foi namorada
O seu corpo é dos errantes
Dos cegos, dos retirantes
É de quem não tem mais nada
Dá-se assim desde menina
Na garagem, na cantina
Atrás do tanque, no mato
É a rainha dos detentos
Das loucas, dos lazarentos
Dos moleques do internato
E também vai amiúde
Co'os velhinhos sem saúde
E as viúvas sem porvir
Ela é um poço de bondade
E é por isso que a cidade
Vive sempre a repetir
Joga pedra na Geni
Joga pedra na Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni

Um dia surgiu, brilhante
Entre as nuvens, flutuante
Um enorme zepelim
Pairou sobre os edifícios
Abriu dois mil orifícios
Com dois mil canhões assim
A cidade apavorada
Se quedou paralisada
Pronta pra virar geléia
Mas do zepelim gigante
Desceu o seu comandante
Dizendo - Mudei de idéia
- Quando vi nesta cidade
- Tanto horror e iniqüidade
- Resolvi tudo explodir
- Mas posso evitar o drama
- Se aquela formosa dama
- Esta noite me servir

Essa dama era Geni
Mas não pode ser Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni

Mas de fato, logo ela
Tão coitada e tão singela
Cativara o forasteiro
O guerreiro tão vistoso
Tão temido e poderoso
Era dela, prisioneiro
Acontece que a donzela
- e isso era segredo dela
Também tinha seus caprichos
E a deitar com homem tão nobre
Tão cheirando a brilho e a cobre
Preferia amar com os bichos
Ao ouvir tal heresia
A cidade em romaria
Foi beijar a sua mão
O prefeito de joelhos
O bispo de olhos vermelhos
E o banqueiro com um milhão
Vai com ele, vai Geni
Vai com ele, vai Geni
Você pode nos salvar
Você vai nos redimir
Você dá pra qualquer um
Bendita Geni

Foram tantos os pedidos
Tão sinceros, tão sentidos
Que ela dominou seu asco
Nessa noite lancinante
Entregou-se a tal amante
Como quem dá-se ao carrasco
Ele fez tanta sujeira
Lambuzou-se a noite inteira
Até ficar saciado
E nem bem amanhecia
Partiu numa nuvem fria
Com seu zepelim prateado
Num suspiro aliviado
Ela se virou de lado
E tentou até sorrir
Mas logo raiou o dia
E a cidade em cantoria
Não deixou ela dormir
Joga pedra na Geni
Joga bosta na Geni
Ela é feita pra apanhar
Ela é boa de cuspir
Ela dá pra qualquer um
Maldita Geni

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Reflexões


O blog se chama “Papos e Reflexões” e vou falar de uma de minhas reflexões mais freqüentes.
É quando olho para minha vida e (re)vejo as pessoas que fizeram e fazem parte dela.
É interessante ver o modo como cada uma me afetou e como isto se dava conforme as circunstâncias, são N motivos, são e foram diferenças de vivência, estados emocionais, momentos, situações extraordinárias ou mesmo banais.
Eu sempre falo que as piadinhas que contamos são uma amostra do poder de influência das pessoas, por que passamos anos contando uma piada e nem mesmo lembramos quem nos contou a primeira vez.
É impressionante observar o poder que as pessoas têm de nos influenciar, de nos afetar e simplesmente não se darem conta.
Óbvio que, por conseqüência, o oposto também é verdadeiro, pois afetamos as pessoas com quem lidamos, não importa o tamanho ou a duração do contato, certamente em algum grau afetamos.
E nos aprofundando mais percebemos que não existem padrões, podem ser pessoas de extremo requinte intelectual ou mesmo pessoas bem simples, mesmo em silêncio, mesmo na euforia, podem ser jovens ou velhos, crianças ou idosos, homens ou mulheres, serenos ou raivosos.
Lendo meu blog é possível encontrar vários dos personagens de minha vida, alguns tratados bem especificamente, outros com um olhar mais distante, mas o mais interessante é que personagens diversos se identificavam em uma história, quando na realidade não havia feito qualquer menção.
Ou seja, as interações são mais complexas do que pensamos, as pessoas interagem de maneira tão complexa que muitas vezes fica difícil medir o impacto que temos na vida dos outros.
O que vejo nestas reflexões é o quanto somos poderosos sem perceber, que nos prendemos ao que é dito e nunca avaliamos o que não é dito.
Que somos mais capazes de afetar o outro do que imaginamos, somos mais capazes de influenciar nossos destinos do que nossa competência permite perceber.
As mulheres então, nossa, é um capítulo a parte, se soubessem do que são capazes o mundo já vestiria saia.
O entendimento é possível e muitas vezes ele se dá e não percebemos, por que ficamos tão envoltos pelo conflito das discussões e da tentativa de fugir deste desgastante processo que não enxergamos nossa capacidade de fazer nosso destino através da conversa, da ação, não contabilizamos os sucessos.
Não estou dizendo aqui que um dos lados prevalece, na realidade é o confronto de forças que estabelece o equilíbrio e as conquistas.
Bom, tiro destas reflexões algumas conclusões:
Jamais desistir de dialogar,
Jamais menosprezar seu valor,
Jamais ignorar sua capacidade de afetar o seu e o destino alheio,
Jamais deixar de observar o quão encantador é este processo complexo de se relacionar.
Provavelmente deixei algo de fora, gosto de comentários, gosto de críticas, gosto de confrontos, gosto do aprendizado, todo e qualquer texto escrito nunca está absolutamente fechado, são as interações que preenchem as páginas ainda em branco, em um blog a interação se dá pelos comentários, então usem e abusem.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Escolhas e Conselhos


Quando crianças recebemos os melhores ensinamentos de nossas vidas, aqueles que servirão para todas as ocasiões, no entanto nos faltará a perspicácia de aproveitá-los e dimensiona-los.
São as histórias que ouvimos, os contos, as fábulas, os ditados que parecem tão infantis mas que são profundamente aconselhadores e que se encaixarão em cada dificuldade futura de nossas vidas mas nem sombra será em nossa memória.
Confrontando as histórias de nossas vidas com os ensinamentos do passado constatamos infelizes que não aproveitamos nada.
E olha que no kit de ensinamentos havia lições sobre inimizades, traições, escolhas erradas, convicções equivocadas, companhias inadequadas, conselhos furados, etc...
Vejo tanta gente seguindo caminhos estranhos, mas deslumbradas com os falsos encantamentos do caminho não percebe as armadilhas, não percebe o erro da escolha, quantas histórias ouvimos ainda crianças sobre isto?
Conselhos, companhias e convicções pessoais são os nossos anjinhos e diabinhos do momento, orientando e estimulando nossa caminhada até que...
Pois é, quando a verdade se revela, quão dolorosa ela pode ser...
Durante a caminhada a floresta é verde, segura, linda, o ar é puro, tudo é encantador, os animais são amistosos, o rio é de água límpida...
Mas tudo compõe nossa visão distorcida da realidade, distorção que conta com uma grande colaboração nossa.
E olha que durante a caminhada somos colocados a prova tantas vezes, assim como nos contos infantis, recebemos alertas, mas nossa teimosia ou seja lá o que for nos impede de ver.
Os ditados, textos curtos, alguns que cabem em pára-choques de caminhão, são como as placas de uma rodovia alertando para os riscos, buscando a prudência de nossas ações.
Quanto mais tarde for a descoberta, mais dolorosa e talvez irreversível ela será...
Seria tudo fácil se a história de cada um não afetasse tantas outras vidas, como é difícil enxergar os desacertos de alguém que gostamos, desacertos que muitas vezes nós mesmos já cometemos, e descobrirmos nossa incapacidade de ajudar, nem sempre por falta de esforço, mas por nos tornarmos impermeáveis em nossas caminhadas.
Por vezes vale a pena deixar, se manter a distância segura observando, sempre próximo o suficiente para socorrer, dizem, com acerto, que o tempo é bom conselheiro. Mas como é difícil deixar quem gostamos sofrer tanto ou saber que sofrerá e deixar acontecer.
Nos contos infantis sempre termina com “foram felizes para sempre”, mas em conseqüência de uma mudança de rumo, do amadurecimento da percepção das coisas, do entendimento de quem está realmente ao nosso lado.
Bom, não tenho conselhos a dar, nada que seja melhor do que as histórias que ouvimos, se você fez suas escolhas, se acha que está no caminho certo, recorra à biblioteca de sua memória, relembre cada frase ouvida, cada conto lido com carinho para você, se você perceber alguma semelhança com a realidade, cuidado...

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Roda Viva

Chico Buarque - Roda Viva

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá
Roda mundo (etc.)

A roda da saia, a mulata
Não quer mais rodar, não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou
A gente toma a iniciativa
Viola na rua, a cantar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a viola pra lá
Roda mundo (etc.)

O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá
Roda mundo (etc.)



Esta letra de Chico, como tantas outras, tem mais de um significado possível, o mais popular era a critica velada à ditadura que brotava das entrelinhas.
Mas não é o aspecto político da letra que quero comentar, mas sim de como a vida, por mais que pareça o contrário, não está em nossas mãos.
Estes dias conheci uma menina pela internet, alguém que eu acompanhava com interesse há muitos meses, se ela não me dissesse a idade, provavelmente a trataria como um mulher mais velha.
Seria uma mulher com pequenas crises de imaturidade e não uma mocinha com muita maturidade.
E te faz pensar como a vida te joga no mundo e diz: viva, dê seu jeito.
De repente você está vivendo coisas que jamais imaginou, que nem teve chance de se preparar.
Algumas poucas pessoas pegam o furacão, colocam cela e saem cavalgando, outras são jogadas pra lá e pra cá sem rumo, sem direção, ficando as marcas das pancadas que levam a cada reviravolta do turbilhão que a vida se torna.
Esta menina está no primeiro caso, ou pelo menos quase lá. Ainda se defende usando as armas que tem, ainda se protege usando os escudos que tem, ainda se recolhe e chora usando os abrigos que tem.
Para se chegar até ela é preciso “despi-la”, tirar todos os véus que a cobrem, a escondem, véus que tem como objetivo enganar, dificultar a visão de quem a observa.
É difícil enxergar a mocinha verdadeira, nem ouso me arriscar a dizer que já conheço sequer parte, mas ouso dizer que é uma descoberta valiosa.
Mas por que a vida age assim? Nos tira do conforto da nossa vidinha e joga no mundo?
Mas antes que simplifiquem minhas palavras, não estou falando aqui de mais uma história adolescente, de mais um roteiro comum de nossos adolescentes, não, é mais complexo que isto, é mais elaborado, eu diria até que mais refinado.
É uma combinação estranha que vai jogando, manipulando os fatos conduzindo para rumo indefinido, direção incerta, e que vai exigindo adaptação, num ambiente inóspito para se crescer, viver e se tornar adulto.
Ainda assim ela sai uma adulta orgulhosa, de olhos expressivos, personalidade forte e sem perder a ternura.
Mas por que a vida age assim?
Não sei, talvez por que queira nos forjar a ferro e fogo para algum desafio futuro, talvez por que queira nos usar como exemplo, talvez castigo divino para nossas vidas passadas...
E se a vida não for o furacão que imaginamos e sim nossas escolhas que nos joga dentro dele?
Mas como cobrar que alguém tão jovem tome decisões sábias? Então quando jovens estamos nas mãos dos adultos?
Talvez isto torne tudo mais cruel, sermos jogados no olho do furacão justamente por aqueles que deveriam nos proteger.
Mas...
Nem sempre toda astúcia e sabedoria adulta consegue nos proteger do inevitável.
E nossa continha de somar e diminuir começa a virar uma equação, e como resolver uma equação quando ela nos pega numa fase da vida que mal aprendemos a dividir?
Tantas possibilidades e lá estamos nós no olho do furacão.
O que torna mais admirável esta bela mocinha, que talvez nem tenha se dado conta do furacão, botou sua melhor roupa e viveu, vencendo cada fase, cada desafio.
Mas fez isto com uma artimanha, se encheu de véus, tem a arte de ludibriar, induzir ao engano, dificultar a visão de quem tenta preguiçosamente lhe observar.
Para entendê-la, é preciso ser paciente, cuidadoso, atento. É preciso se aproximar e recuar na medida exata, afinal, ela usa armadura em forma de véus.
Esta mocinha passa despercebida à maioria, prova de sua imensa capacidade de domar o furacão, esta menina mulher que ainda tem tanto a viver mas já viveu tanto, esta mocinha que faz a gente pensar em como a vida é uma roda viva e com leis que parecemos ser incapazes de decifrar.
Esta mocinha com sua ousadia e coragem, de olhar tão penetrante e sorriso tão doce, tão cheia de vida e medos, tão cheia de vontades e desejos, tão segura do que quer, tão forte e tão necessária de carinho, tão menina e tão mulher, que diz coisas como se tivesse vivido anos, que reage como se acabasse de virar mulher, que mal se dá conta do que representa.
E como a vida te desafia ao colocar diante de você algo especial que só pode ser desvendado através do olhar diferenciado, de sair da posição cômoda que temos a tendência de adotar na vida para uma posição que privilegie o olhar e as descobertas do novo, que exige de nós algo mais do que um simples olhar e palavras cotidianas.
Acho que todos nós temos histórias de sucesso e fracasso quando confrontados com estas oportunidades, coisas que conquistamos ou perdemos, o fracasso pode ser medido pelo simples fato de não termos percebido a oportunidade e o sucesso pelo vislumbre através das pequenas frestas da vida.
Pois bem, os ensinamentos que esta mocinha nos trás é que jamais devemos ver a vida de maneira preguiçosa, que jamais devemos perder a fé nas pessoas, que jamais devemos esquecer como a vida pode ser encantadora, que por mais que ela pareça escorregar entre os dedos, podemos colocar cela no furacão e doma-lo.
Feliz de quem pode descobrir através das frestas da vida pessoas tão belas e ricas como ela, que apesar de tão jovem já ensina tanto.