sábado, 14 de julho de 2007

Peças do Destino - Por uma Menina...

Estávamos no mês de Julho... minhas provas na faculdade haviam terminado, finalmente férias! Mas, o que vou fazer durante esse período todo? Sair com os amigos? pode ser... mas isso eu faço sempre... Visitar parentes que moram longe de mim? Passar um tempo com eles? pode ser também... mas depois de uns dias, ficará sem graça...


Um dia depois do término das provas, surge mais uma briga com meu namorado... damos um tempo... Penso: "Que droga, de novo... quer saber? Vou viajar, ficar um tempo longe de tudo e todos."Vou à uma agência de viagens e decido ir para o Canadá. Sempre tive vontade de ir para lá, conhecer lugares novos, pessoas, culturas diferentes... e o melhor, sozinha! Eu viajaria no final daquela semana mesmo então não poderia perder tempo, precisava comprar roupas e tudo que seria necessário para a viagem.


O grande dia chegou... que ansiedade! Meu irmão me levou ao aeroporto... fiz o check-in, peguei a minha passagem e um tempo depois, lá estava eu sentada na minha poltrona, dentro do avião...


Chegando ao meu destino, peguei as minhas malas e fui em direção ao grupo do qual eu pertenceria pelas próximas semanas. O grupo era formado de aproximadamente 40 pessoas, dentre elas, casais, tias e sobrinhas, irmãos, amigos e pessoas "largadas no mundo" como eu...


Logo de cara, fizemos um city tour pela cidade onde ficaríamos pelos próximos 3 dias. Mas devido ao cansaço da viagem, a maioria do grupo adormeceu ao som da voz calma de nosso guia local. Algumas horas depois, estávamos na recepção do hotel (onde fomos recebidos muito bem e com cestas de maçãs... as mais vermelhas e apetitosas que eu já vi. Depois viria a descobrir que as cestas eram supridas de maçãs todos os dias pela manhã). Após a distribuição dos quartos e a orientação do guia local com relação aos horários do dia seguinte, peguei a minha chave e fui até o meu quarto. Me acomodei e depois de um belo banho, senti minhas forças revigoradas. Agora, só precisava sair à procura de uma casa de câmbio e uma loja para comprar cartões telefônicos.


No dia seguinte, todos descansados, começamos nosso passeio.


Visitei lugares maravilhosos, conversei com pessoas alegres, divertidas, interessantes, vi paisagens inesquecíveis. No entanto, já havia se passado 5 dias desde a minha chegada e só naquele momento, comecei a reparar que era seguida, era observada por alguém. Só naquele momento percebi um homem com a aparência de ter seus 40 e poucos anos, acompanhado de sua esposa e um casal de filhos adolescentes, que pertencia ao mesmo grupo que eu. Percebi que esse homem estava sempre observando meus passos, meu deslocamento pelo local, as coisas que gostava, que comprava, as roupas que eu vestia, me olhando todas as vezes que eu passava pelo seu assento no ônibus. Mas apesar de tudo isso, não me senti incomodada, estava feliz pela viagem e por estar aproveitando as minhas férias de uma maneira antes não pensada.


Em uma das noites sem programação, estava em meu quarto assistindo aos programas de tv, tentando buscar um bom filme.


Sentada em minha cama, de camisola, me alimentando com uma maçã "roubada" da cesta na recepção. Sobre a cama, algumas frutas jogadas, uma saladinha e um sanduíche natural comprados no mercadinho perto do hotel. Naquela noite não teríamos saídas programadas e eu estava com preguiça de sair para jantar. Havia decidido passar no mercadinho, comprar algumas coisinhas e me trancar no quarto.


Me alimentei, me diverti assistindo a um programa de auditório, me arrumei para dormir. Naquela cama gostosa, me envolvi nas cobertas, abracei um dos travesseiros e me preparei para receber o sono.


De repente, ouço batidas na porta. Penso: "Quem será a essa hora? Será que o volume da TV estava muito alto, a ponto de incomodar o quarto ao lado?". Me levantei devagar e fui em direção a porta. Olhando através do olho mágico, a surpresa: aquele homem com a aparência de 40 e poucos anos, que pertencia ao meu grupo e me olhava tanto, diante da minha porta! Penso novamente: "Meu Deus, o que faz aqui? Será que aconteceu alguma coisa?". Retiro a trava da porta e a abro devagar.


"- Oi..


- Olá... aconteceu alguma coisa? Vc precisa de ajuda?


- Me desculpe por bater em sua porta a essa hora, mas preciso conversar com vc...(cabisbaixo, sem me olhar nos olhos..)


- Conversar comigo? Mas o que aconteceu?


- Preciso te contar algo sério.. será que podemos conversar ai dentro?


- Claro que sim, desculpe... vc quer entrar?


- Sim, por favor."


Aquele homem, viajando com sua família, o que poderia querer comigo?Pedi para que se sentasse sobre a cama... me sentei ao lado dele, olhando o seu rosto baixo... sua expressão preocupada...esperei que começasse a falar...


- Essa viagem não está como eu imaginava que fosse...


- Vc e sua família não estão gostando?


- Na verdade, essa viagem não passa de uma desculpa... meu casamento estava passando por momentos difíceis e pensei que uma viagem melhoraria tudo. Minha esposa e eu estávamos brigando muito e pensei que isso poderia apaziguar os ânimos. Mas não saiu como eu esperava, brigamos hoje novamente.


- Eu sinto muito. Mas não fique assim, todos os casais brigam.


- Desculpe por vir até aqui, mas vc me pareceu uma garota tão centrada, tão correta. Queria desabafar e não sabia o que fazer. A primeira pessoa que me veio à mente foi vc. Desculpe se lhe incomodo (nesse momento, seu rosto se levantou e seus olhos agora estavam direcionados aos meus)


- Eu não sei muito sobre casamentos e relacionamentos sérios, mas posso tentar te ajudar caso se sinta a vontade mesmo em desabafar comigo.


- Obrigada menina. E eu nem sei o seu nome...


- T....... e o seu?


- Roberto.


- Muito prazer, Roberto.


- O prazer é todo meu, T.....


Nessa noite, conversamos mais um pouco, antes dele voltar ao seu quarto.A partir daí, quase todas as noites, ele aparecia em meu quarto para conversarmos.


Em cada hotel que nos hospedávamos,ele arrumava uma maneira de conseguir o número do meu quarto.


Uma noite, estávamos sentados no chão do quarto, vendo televisão, rindo e comendo besteiras. De repente, um silêncio reinou entre nós dois e ouvíamos apenas o som vindo da televisão. Nossos olhos se encontraram, nossos corpos foram ficando mais próximos, nossos rostos já não podiam mais desviar. Nos beijamos... um beijo suave, tímido... olhamos um para o outro... sorrimos... nos beijamos novamente...


Aquele homem, mais velho do que eu, pai de família, estava indo todas as noites em meu quarto para conversarmos, ficarmos... não rolava sexo... apenas carinhos...


Na última noite antes da volta para casa, ele revelou que estava pensando em se separar e que queria muito que continuássemos o nosso relacionamento, que se tornasse algo mais sério, assumir perante todos um namoro ou algo mais. Na hora, fiquei assustada... como poderia concordar com aquilo? Eu não estava certa em me relacionar com um homem casado, ainda mais tão descarado assim (já que a esposa dele tbm estava na viagem) mas não poderia concordar com o fim do casamento. Não seria justo com seus filhos, sua esposa. O casamento poderia ser salvo com conversas, atitudes e eu senti que naquele momento, as minhas atitudes não deixavam que ele tomasse as dele da forma correta. E nesse dia, conversamos mais do que todas as outras noites.


Decidimos que cada um seguiria a sua vida e que guardaria aqueles momentos em um baú de boas lembranças. Concordamos que aprendemos muito um com o outro e que decidimos pelo certo.


No dia seguinte, no aeroporto, troquei endereços de e-mail com o restante do grupo, menos com Roberto. Não tinha o intuito de fornecer contato algum para ele, já que havíamos decidido nos tornar apenas lembranças.Nos despedimos e embarcamos de volta para casa.... cada um seguindo o seu caminho...


Apesar desta história ter finalizado desta forma, fui surpreendida semanas atrás com um e-mail que dizia.


" Querida T......,


Quanto tempo! Será que irá se lembrar de mim?


Desde o momento que nos despedimos, naquela viagem, fiz algo que não pude lhe contar naquele momento. No entanto, agora criei coragem e estou provando o que fiz. Sem o seu consentimento, anotei o seu endereço de e-mail do caderno de uma das pessoas do grupo. Infelizmente, só tive a coragem de enviar o e-mail hoje. Sei que já se passou 1 ano e que muitas coisas aconteceram em nossas vidas. Mas devo lhe dizer que nunca me esqueci de vc e dos momentos que passamos juntos.


Vc é uma pessoa encantadora, alguém que não devemos deixar escapar quando aparece em nossas vidas. E pensando dessa forma, criei coragem para te escrever, na esperança de se lembrar de mim e também querer o meu contato.


Hoje continuo casado, mas meu casamento não melhorou em nada com relação ao que te contei tempos atrás. Em muitos momentos, senti vontade de jogar tudo para o alto e me separar. Mas sempre que pensava assim, me lembrava de nossas conversas, de vc me dizendo para se acalmar e pensar melhor. Sempre pensava em suas palavras e isso me acalmava.


Espero que vc esteja muito bem e que Deus esteja te dando bastante saúde e felicidades.


Tenho a esperança de receber uma resposta sua, nem que seja para me dizer que prefere se manter longe.


Me arrependo de ter te deixado escapar enquanto a tinha em meus braços (rs)


Aguardo sua resposta.


Beijos,


Roberto"


Nesse momento, todos os pensamentos e momentos que antes estavam guardados no baú, agora vem à tona.


Pq será que nossa vida, nosso destino nos pregam tantas peças?



Por uma menina...

4 comentários:

Um observador disse...

É tão difícil comentar essa história. Ela é tão rica de nuances, variáveis que a única coisa que podemos fazer é cogitar.
Alguém pode condenar a menina? Não. Mas alguns diriam: "Ela não deveria ter deixado ele entrar no quarto dela, foi muita ingenuidade".
De fato. Mas por que ingenuidade? Não é uma leitura dos tempos modernos? Por que devemos ser antipáticos para evitar maiores problemas? Por que no exercício de nossa esperteza diante da vida, na precaução com que a encaramos devemos manter a correntinha na porta ao invés de receber o convidado surpresa?
Não estou defendendo esse ou aquele caminho, mas constatando que infelicidade é termos que agir por medo, precaução.
Por que devemos refrear nossos gestos de amizade temendo que as coisas fujam do controle, temendo desencontros de vontades?
Por que submetemos nossos atos ao julgo do outros, não podemos agir sem nos preocuparmos com o que os outros vão pensar?
E me colocando do outro lado, por que nos precipitamos em julgar as pessoas como se a vida, sentimentos e gestos coubessem num manual onde tudo teria seu significado descrito rigidamente?
Temos medo do outro, toda relação se dá com a precaução e repressão necessária para lidarmos com o outro.
Temos medo de sermos amigos com medo de que o outro veja entrelinhas inexistentes, que os "observadores" passem a ver o que não existe.
Pior é que muitas vezes nós somos vítimas desse processo. Quem nunca se flagrou pensando se existia algo mais numa amizade, nos gestos de carinho de um amigo?
Ler essa bela história e procurar nela defeitos de conduta é até injusto, mas estamos sendo moldados a maliciar tudo, a nos defender de tudo, perdemos a naturalidade dos gestos, a fluência do carinho por medo, precaução.
Amar ficou restrito a uma só pessoa ou vulgarizado na boca de tantos.
Não amamos mais nossos amigos? Não amamos mais nossos pais? Não amamos mais nossos filhos?
Por que não podemos ser intensos no amor que dedicamos aos amigos queridos?
Que injusta é essa sociedade que nos reprime, que nos educa a suspeitar de tudo, a condenar qualquer gesto mais intenso de carinho quando não é dedicado ao suposto único amor de nossas vidas.
A sabedoria não está em saber limitar o amor, a sabedoria está em saber sim conversar quando algo sai errado, saber decidir pela preservação do que de fato une duas pessoas.
E essa sabedoria que vemos aqui, pelo menos de uma das partes.
Mas como o mundo é muito cruel, que nos faz carentes, solitários, brigando com nossos sentimentos que querem ser intensos mas estão reprimidos, quando surge um gesto maior de carinho, amor, ficamos tentados pelo erro, ficamos tentados a ceder ao amor impossível, ao amor errado.
Nossa bela menina descreve como algo pode surgir de maneira inesperada, nos ambientes mais inóspitos, crescer com beleza impar, perder o controle movido por forças desconhecidas, recuperar a razão de forma decidida e em nossa fragilidade ficar em tentação pelo impossível.
A sociedade vem nos moldando a sermos máquinas, selecionando nossos sentimentos e a intensidade que dedicamos a cada um, conforme critérios pré estabelecidos.
Viramos um hardware com um software repressor.
Não é a toa que vemos tanta rebeldia por ai, não é a toa que vemos tanta infelicidade por ai.
Estamos perdendo o prazer de viver as menores coisas por medo de contrariar alguma diretriz do tal software.

Quem agora é capaz de condenar o gesto de abrir a porta quando uma quase estranho bate nela?

Anônimo disse...

Ler esse comentário me fez pensar na forma do amor, como ele é, como se revela e para quê. Será mesmo que existem tantas definições na qual uma simples palavra caiba, talvez seja mais simples do que todas as nossas tentativas de decifrá-la. Será mesmo que podemos amar de formas variadas, sem medo, sem pudor, com entrega??? Amar nossos amigos, irmãos, parentes...amar nossos verdadeiros amantes, a essencia, a raiz desse sentimento não é sempre a mesma?
O que faz então tudo parecer obscuro, nebuloso e "errado"???
Onde está a linha que separa a ingenuidade da maldade, o certo e o errado???
Se amar é mesmo algo que não cabe em definições, regras e conceitos então porque estamos sempre medindo, pesando e tentanto encontrar uma definição para o amor.

Um observador disse...

Acho que o amor errado é quando acatamos o que o software nos impõe, quando passamos a acreditar que o verdadeiro amor não existe, quando aceitamos como verdade que o amor que temos basta, que não conseguiremos amor maior.
Quando por preguiça, carência, acomodação ou insegurança aceitamos o que vem ou o que nos induzem a acreditar, deixando de buscar o que realmente nos fará felizes.

Um observador disse...

Não é possível catalogar o amor, mas é possível vivê-lo de maneira intensa, busca-lo incansávelmente, jamais perdendo as esperanças de encontra-lo, por mais que tentem nos prender em regras, devemos nos rebelar e aceitar que ele não se dimensiona, não cabe em embalagens.